terça-feira, 4 de dezembro de 2012

Capítulo III: Outro ponto de vista, a vontade de poder...

Neste capítulo, Jung começa a discutir a neurose sob um ponto de vista diferente, o do psicólogo austríaco Alfred Adler e sua teoria a respeito do desejo de poder. O argumento deste capítulo, é construído através de uma análise da vida do filósofo Nietzche, alemão nascido em 1844, que, segundo Jung, teria vivido fielmente de acordo com seus instintos:

"Não é admissível considerar inautêntica uma vida como a de Nietzche, pois ela foi vivda até as últimas e fatais consequências, numa grande fidelidade à natureza do impulso de poder que lhe servia de base." (p.26)

 



Ficheiro:Alfred Adler1.png




 Alfred Adler, nasceu em Viena no ano de 1870. E sobre ele Jung diz:

"Quis o destino que um dos primeiros discípulos de Freud, Alfred Adler, estabelecesse um conceito de essência da neurose baseado exclusivamente no princípio do poder..."

 Uma das grandes diferenças entre as idéias  adlerianas e freudianas, segundo Jung,  é que de início para Freud tudo é efeito estritamente causal de fatos anteriores e para Adler, ao contrário, tudo é manobra condicionada pelo fim."(p. 27) Adler, tendo em vista tal paradigma questiona "se pode existir um amor sem finalidades." (p.30). E termina por concluir que:

 "O amor e o comportamento irrepreensível são armas extremamente adequadas para se alcançar a meta, do ponto de vista do impulso de poder. A virtude não raro, serve para forçar o reconhecimento dos outros." (p. 30)

Para Adler, a neurose possui o poder de controlar toda a vida dos que nela estão envolvidos de uma forma ou de outra tornando-se assim um mecanismo claro de obtenção de poder:

"Quando topamos com algo que não conseguimos submeter pela razão ou pelo charme, existe um mecanismo até então desconhecido para ela e que a mãe já havia descoberto: a neurose... Não há meio mais eficaz de tiranizar toda a casa."(p.31)
 
 (http://www.cinemaqui.com.br/noticias/diretor-de-poder-sem-limites-deve-comandar-adaptacao-de-hq-da-image)

Adler e Freud divergiram irreversivelmente quando  o primeiro negou a teoria da origem sexual das neuroses e a do conflito intrapsíquico entre Id, Ego e Superego do segundo. Segundo o site: (http://www.redepsi.com.br/portal/modules/wordbook/entry.php?entryID=135), em 1927, concebeu, em Conhecimento do homem, o princípio da unidade fundamental do ser humano.  Pensou assim a psicologia como uma dinâmica das relações interpes­soais, fazendo referência ao que chamou de sentimento comunitário.Assim, elaborou-se uma Psicologia In­dividual que levava em conta a situação do indivíduo no interior do grupo, e que deu origem a um método de psicoterapia mais breve e mais flexível do que a psicanálise, propondo ao paciente e ao terapeuta uma relação mais igualitária e recorrendo mais à finalidade do objetivo a atingir do que à causalidade dos distúrbios




Friedrich Nietzche, o filósofo alemão tem sua vida analisada por Jung neste trecho do livro, sob a luz da teoria de Adler. Tal filósofo, morreu de complicações decorrentes da sífilis e em um estado de insanidade mental conforme diagnosticado na época.
Sobre este pensador, Jung afirma que o mesmo entrou em contato de uma forma extrema e doente com seu lado sombrio não tendo conseguido alcançar o equilíbiro pessoal, fato que pode ser facilmente constatado pelo fato dele ter se isolado cada vez mais do convívio com as pessoas até atingir um estado de profunda confusão mental em que passou a assinar suas cartas como, "o crucificado" e "dionísio." Diz Jung:

"Na realidade, a natureza humana é portadora de um combate cruel e infindável entre o princípio do eu e o princípio do instinto: o eu, todo barreiras; o instinto sem limites; ambos os princípios com igual poder." (p. 26)

Ao tentar compreender a queda final de Nietzche, Jung ressalta que:

"Sabe-se que é matematicamente certa a previsão de que à alegria e ao êxtase que nos arrebatam a alturas heróicas e divinas corresponde uma queda proporcional em profundidade." (p.24) Ou seja, o fato de atingir o ápice do sentimento de ser um "super-homem" , não o poupou de uma queda igual e proporcional  a este mergulho.


 Feita esta breve análise da vida de Nietzche,  ele passa então a argumentar e pensar sobre as diferenças entre as teorias freudianas e adlerianas e conclui como negativo o pouco espaço que Freud dá ao desejo do poder que chamou de"impulso do eu" frente ao fator sexual. O psicólogo suiço defende tal idéia dizendo que:

"A meu ver,não há nenhuma razão para admitir a autenticidade de Eros e negar a da vontade de poder; esta é sem dúvida, um demônio tão grande, antigo e primordial quanto Eros." (p. 26). Jung como bom cientista termina por deixar uma indagação no final de seu capítulo, dando a entender que uma escola não tem como se reconciliar com a outra:

"Mas qual dos dois pontos de vista, afinal, é o verdadeiro? Num dos casos, Eros e seu destino são a realidade suprema e decisiva;no outro, é o poder do eu. No primeiro caso, o eu não passa de uma espécie de apêndice do Eros; no segundo, o amor não passa de um meio para se atingir a meta, que é dominar. Quem valoriza o poder do eu revolta-se contra a primeira concepção, mas quem dá importância a Eros nunca há de reconciliar-se com a segunda." (p.32)

No meu caso, acho de grande interesse a teoria de Adler que passei a conhecer melhor agora. Já tinha ouvido falar sobre ele junto a conceitos como "complexo de inferioridade"  e penso que sua divergência com Freud faz sentido pois, a partir deste ponto de vista podemos passar a entender melhor o funcionamento de disputas sociais por poder, por exemplo.
Fiquei surpresa ao ler em alguns sites da internet que Adler leu Marx , o que me fez ficar mais interessada em sua teoria já que a influência das diferenças coletivas e econômicas na psique humana me fascinam profundamente.

Para terminar, veja neste link uma cena clássica do seriado o Jovem Indiana Jones em que Jung, Freud e Adler jantam juntos...Que delícia de jantar, não?
(http://www.youtube.com/watch?v=DHuai5rDvug)

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Sonhos ictifálicos...

" O objeto era estranhamente construído: feito de pele e carne viva, sua parte superior terminava numa espécie de cabeça cônica e arredondada, sem rosto nem cabelos. No topo, um olho único, imóvel fitava o alto. (Memórias, sonhos e reflexões, p. 41)

" ...portanto o sombrio senhor Jesus, o jesuíta e o falo seriam idênticos. A significação abstrata do falo é assinalada pelo fato de que o membro em si mesmo é entronizado da maneira ictifálica = ereto." (p.42)

      ( Hermes em formato ictifálico)


quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Lago Bodensee - Turgovia- Suiça

"Posteriormente, minha mãe viajou comigo para a Turgóvia, em visita a amigos que habitavam num castelo à beira do lago de Constança... Foi então que se fixou fortemente em mim a ideia de que eu deveria viver à beira de um lago.Parecia-me impossível viver sem a proximidade da água." (p.36)

Monte Uetilberg - Suiça

"Vi os Alpes pela primeira vez! Disseram-me então que no dia seguinte as crianças de Daschsen fariam uma excursão escolar a Zurique sobre o Uetilberg. Eu queria a todo custo ir com elas. Mas para minha tristeza, disseram-me que crianças tão pequenas não poderiam participar.Não havia nada a fazer. A partir desse momento, Zurique e o Uetilberg foram para mim a inacessivel terra prometida, perto das flamejantes montanhas cobertas de neve." (p.36)


Monte Uetilberg - Zurique - Suiça
 http://www.elaeamericana.net/2012/11/uetliberg.html



Zurique, Alpes suiços ao fundo
http://www.mundi.com.br/Fotos-Zurique-283654.html

Infância

 " Seis meses após meu nascimento (26 de julho de 1875) meus pais mudaram-se de Kesswill (cantão da Turgóvia) , a beira do lago de Constança, e foram morar no presbitério do castelo de Laufen, que domina as quedas do Reno."(Memórias, sonhos e reflexões, Infância)







 Kesswill - Cantão da Turgóvia - Suiça














Lago de Constança- Suiça

http://penacorredoira.blogspot.com.br/2011/04/ruta-por-el-lago-bodensee-ciclismo-en.html






Torre do Castelo de Laufen- Cataratas do Reno- Suiça

https://picasaweb.google.com/114237914395885028135/Suica2000#5119690288022319986







Cataratas do Reno com vistas para o Castelo de Laufen

http://deixaqueeutelevo.blogspot.com.br/2012/07/rheinfall-cataratas-do-rio-reno.html


   

A crítica do fim do capítulo e o reconhecimento da contribuição de Sabina Spilrein....

"O excesso de animalidade deforma o homem cultural; o excesso de cultura cria animais doentes."

Somos tanto animais quanto pessoas,  para mim o maior legado de Jung foi nos lembrar que estas duas partes precisam estar integradas, existem instintos e conhecimentos ancestrais, assim como condicionamentos culturais. Como pensá-los sem sermos simplistas, cuidar para não achar exatamente aquilo que já desejamos e já estamos acostumados? Para mim, este tem sido o desafio, aliar espiritualidade e cultura, psicologia e sociologia...Este é o caminho que me fascina hoje, e acredito o fará para sempre...

Jung termina seu capítulo fazendo uma crítica a Freud e sua "teimosia" em dar exclusividade a teoria sexual nas explicações da neurose:

"A teoria sexual da neurose freudiana fundamenta-se, portanto num princípio verdadeiro e real. Comete, no entanto, o erro da unilateralidade e da exclusividade, além da imprudência de querer apreender Eros, que nunca se deixa capturar numa grosseira terminologia sexual. Neste ponto Freud é também um dos representantes de sua época materialista, que nutria a esperança de resolver todos os enigmas do mundo num tubo de ensaio. O próprio Freud, depois de velho, reconheceu essa falta de equilíbrio de sua teoria e contrapôs a Eros, que chamou de libido, o instinto de morte, ou de destruição. Esta idéia é de autoria da minha aluna Dra. Sabina Spilrein publicada em 1912 no Jahrbuch. " (p.20)

Sobre os dois instintos Jung ressalta os escritos póstumos de Freud que utilizam estes conceitos:

"A meta do primeiro é estabelecer unidades cada vez maiores e conservá-la; logo é união. A meta do outro, ao invés, é dissolver relações e assim destruir as coisas. Por isso, também é chamado de instinto de morte."

Terminando este capítulo, Jung ressalta que, para Freud, provavelmente, todo ciclo é um fenômeno energético e que a energia só pode ser produzida pela tensão dos contrários....

Depois de ler esta parte do livro, fiquei me lamentando o quanto de sofrimento Sabina sentiu para chegar a conclusão da existência do instinto de morte.





Na foto: Carl Jung, Sabina Spilrein e Sigmund Freud.



A psicanálise, os instintos e a socialização?

A psicanálise, segundo Jung,  foi acusada de libertar os instintos mais animais no homem. Mas o psicólogo relembra que, não é só a pregação moral que impede que as pessoas caem no que ele chamou de libertinagem. Defende o conhecimento que cada um pode ter sobre a totalidade da sua personalidade argumentando que o que não for integrado aparecerá de outras formas, em outros momentos da vida. Sobre isto diz: 



"No entanto, a necessidade é um regulador muito mais eficaz, pois estabelece limites para realidade, o que é muito mais convincente do que todos os princípios morais reunidos" (p.18)

Outra ponto levantado, é o de que conhecendo nossa própria sombra, podemos compreender e amar nossos semelhantes, enxergando neles as mesmas dificuldades existenciais que as nossas. Assim, diminuindo a hipocrisia nas relações, paramos também de transferir ao próximo a violência que praticamos contra nossa própria natureza.

Continuando, Jung conclui que, segundo a teoria freudiana, uma pessoa sem freios morais teria necessariamente que ser imune à neurose, o que não acontece na prática pois, a a análise de uma pessoa imoral revela que houve simplesmente uma repressão do lado moral (p.18).

Uma das contribuições de Freud, aos olhos de Jung, foi trazer a idéia de que a moral não "veio dos céus" mas sim que constitui uma função da alma humana tão antiga quanto a própria humanidade.

Neste ponto, meu lado sociológico se pergunta, como podemos determinar que existe "uma moral" a priori de toda socialização? A função instintiva de regular as ações, me parece existir como pressuposto. Penso, que há uma socialização baseada em valores específicos, em cada sociedade. O fato de encontrarmos algum tipo de moral em todas as formas de existência humana é aceitável a partir do momento que reconhecemos a diversidade que se apresenta em cada caso.

É o próprio Jung que afirma que: "À medida que uma cultura se desenvolve, é possível submeter massas cada vez maiores ao domínio de uma mesma moral. No entanto, até hoje foi impossível estabelecer uma lei moral que se impusesse além dos limites da sociedade, isto é, no espaço livre de grupos que não dependem um do outro. Aí como no tempo dos nossos ancestrais, impera a ausência do direito e da disciplina e a mais completa imoralidade; esta no entanto, só é denunciada pelo inimigo casual que com ela se confronta. (p.19)

Aqui, discordo de Jung, não podemos conhecer como foram e como pensaram estes ancestrais que ele cita. Por este motivo, acho complicado atribuir-lhes uma falta de moralidade e de disciplina. Não alcançamos suas necessidades e como elaboravam a sobrevivência dentro duas mentes. Tento imaginar como poderíamos  comprovar este argumento e talvez, tivéssemos que conhecer e estudar o comportamento de pessoas que viveram experiências isoladas de qualquer grupo tentando identificar  nelas o conceito de moral.


 (Trailer do filme Nell que conta a história de uma mulher que é criada por sua mãe em uma floresta isolada de qualquer tipo de civilização).